Predestinado, surpreendente, gigante: Ghiggia nos deixa no aniversário do Maracanazo

Alcides Edgardo Ghiggia era mesmo uma figura predestinada. E surpreendente. De saúde debilitada há anos, certamente já havia muito material pronto por aí para falar de sua vida e obra, os quais esperavam apenas o momento de seu falecimento para serem publicados. Pois todos tiveram de ser reescritos. Afinal, quis o destino que ele nos deixasse na mesma data em que entrou em nossas vidas para sempre: um 16 de julho, em 2015, 65 anos depois de calar o Maracanã com o gol que deu ao Uruguai o bicampeonato mundial em cima do Brasil. A coincidência é de arrepiar. E emocionar.

O mais impressionante em relação a Ghiggia é que, ao contrário de muitos ídolos do mundo da bola, ele jamais foi esquecido por quem um dia o idolatrou. Viveu até os 88 anos, sendo o último jogador daquela seleção uruguaia a deixar o mundo, para ser homenageado de todas as maneiras possíveis. E não apenas em seu país: no Brasil, foi sempre alvo de muito carinho e respeito. A corrente positiva para que ele se recuperasse do grave acidente de carro que sofreu em 2012 foi emblemática. E o maior número de mensagens positivas veio justamente do país que entrou para a história como o que ele virou carrasco dentro das quatro linhas.

Tudo isso acontece porque Ghiggia se portou como poucos nestes 65 anos desde que os 2 a 1 de final de 1950 aconteceram. É um ídolo eterno do futebol uruguaio, se orgulhava naturalmente até o último dia de vida ao lembrar aquela partida, mas jamais em tom provocativo. Foi sempre extremamente respeitoso. Encontrou-se com Barbosa, pediu que o Brasil o perdoasse por tratá-lo de forma tão injusta como o culpado por aquela derrota. Ao mesmo tempo que sentia orgulho de sua enorme importância para a Celeste, sempre fez questão de dizer que não sentia prazer algum em ter causado tanta dor no adversário derrotado. Esse tipo de sentimento só os grandes de alma são capazes de sentir, e mais, de admitir.

Ghiggia foi grande dentro do campo e enorme fora dele. Se é ótimo saber que um ícone de seu porte pôde receber todas as justas homenagens que ganhou em vida, é melhor ainda constatar que a admiração que se tinha por sua figura não era algo restrito ao seu país, mas a todo o mundo da bola. Um mundo que fica mais triste, e um pouco menor, a partir de agora. Afinal, não é todo dia que surge alguém com a grandeza de Ghiggia, seja dentro das quatro linhas ou na maneira autêntica, emocionada, elegante e grandiosa de contar as histórias que viveu nelas.

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