Chega de irregularidade



Todos os duelos de ida das quartas de final acabaram em 1 a 0, mas só o Cruzeiro conseguiu este placar jogando como visitante. Não foi tecnicamente o melhor jogo do time de Marcelo Oliveira na Libertadores, pois contra o São Paulo, no Mineirão, os mineiros fizeram uma jornada quase que brilhante. Mas foi o mais inteligente, o que demonstrou maior maturidade de uma equipe que, segundo o próprio treinador, ainda experimenta uma grande irregularidade nesta temporada (em 1997, aliás, não era assim também?).

Era previsível que o River Plate fosse fazer pressão. Empurrada por quase 60 mil torcedores no Monumental de Núñez, a equipe de Marcelo Gallardo arriscaria tudo em abrir vantagem já no jogo de ida. Adiantou suas linhas e as aproximou, tentando manter quase sempre a compactação. Fazia sentido: diante do São Paulo, a Raposa foi mal em sua estratégia de basicamente se defender. Marcelo Oliveira sabia que desta vez as coisas teriam de ser diferentes.

O antídoto para não ficar encaixotado atrás foi assustar nos primeiros minutos. As duas primeiras chances de gol foram cruzeirenses, antes dos cinco minutos, ambas através de bolas paradas que demonstravam a fragilidade de uma retaguarda exposta. Gallardo, de fato, arriscou bastante: liberou Mammana e Vangioni para o apoio, mesmo tendo Marquinhos e Willian a marcar. Ponzio também tinha autorização para subir - e como ele criou problemas... Dos 15 aos 30 minutos, passado o susto inicial, os millonarios viveram seu melhor momento na partida, conseguindo desarmes ofensivos e levando muito perigo a Fábio. Mas Leandro Damião (impedido) quase abriu um placar num contragolpe, relembrando que se atirar muito poderia ser fatal aos donos da casa.

O primeiro tempo já havia terminado equilibrado, e o segundo começava do mesmo modo, sem chances de gol para nenhum dos lados. Isso enervava o River, mas ainda era pouco para o Cruzeiro vencer. Marcelo Oliveira, então, fez a troca que mudou o jogo: tirou o apagadíssimo Arrascaeta e colocou em seu lugar Gabriel Xavier. Logo em seu primeiro lance, deu uma prévia do que seria o gol da vitória: ganhou na pequena área pela esquerda, serviu Willian, que bateu na pequena área, vencendo Barovero, mas não Vangioni, que cortou em cima da linha. O ponto fraco do River é pressionar sua defesa, e isso era o que mais faltava ao Cruzeiro.

Por sua vez, Gallardo foi infeliz nas mexidas. Martínez e Ponzio vinham bem, não precisavam ter saído do jogo. É verdade que o ingresso de Mayada melhorou a movimentação pela direita, mas Pisculichi foi mal mais uma vez, longe de ser o condutor que foi na campanha dos títulos de 2014. A pior, porém, foi a saída de Mora para a entrada de Cavenaghi. Deixava o campo o principal articulador do time, o que mais incomodava a defesa azul, e entrava um centroavante de área, sem a mesma qualidade de criação. Cavegol deixou Teo Gutiérrez livre com um lindo passe aos 22, emendado com um sem pulo que raspou o travessão. Mas foi uma exceção - o River só voltaria a levar algum perigo depois de sofrer o gol, no abafa.

Sem conseguir criar e perdendo qualidade no passe, o time argentino errava muito na frente da área (foram 58 passes equivocados ao longo da partida), propiciando ao Cruzeiro sempre o contragolpe - por isso a entrada de Charles no lugar de Willian, o único erro de Marcelo Oliveira em toda a noite, e que, felizmente, não fez falta no fim das contas, foi um erro de leitura do jogo, ainda mais porque agora, sem Mora, o River não criava tantos problemas que exigissem a presença de outro volante. Mas deu tudo certo: foi numa lateral que surgiu o gol da vitória, iniciado numa dividida de Damião com a zaga, uma entrada incisiva de Gabriel Xavier e um toque certeiro de Marquinhos, melhor jogador do time na Copa 2015. Um gol que deixa o Cruzeiro muito perto das semifinais.

Muito perto, mas, claro, ainda não dentro delas. O River Plate se acostumou a virar situações complicadas nesta Libertadores, e pode vencer no Mineirão sem que possamos considerar isso um crime. Porém, terá de se expor, como fez em Buenos Aires. E o Cruzeiro gosta de jogar fechado, explorando contragolpes. Ganhou dois Brasileiros com várias vitórias assim, e fracassou na Libertadores do ano passado quando precisou propor jogo.

A vitória de ontem foi daquelas que moldam um campeão da América. O Cruzeiro mostrou maturidade, qualidade e inteligência de time credenciadíssimo a ganhar a Libertadores. A atuação em Buenos Aires foi para espantar a irregularidade e afirmar a equipe de Marcelo Oliveira nesta temporada, algo que nem a classificação diante do São Paulo conseguiu. Convenhamos: esta é a hora certa para crescer.

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Ficha técnica
Copa Libertadores da América 2015 - Quartas de final - Jogo de ida
21/maio/2015
RIVER PLATE 0 x CRUZEIRO 1
Local: Monumental de Núñez, Buenos Aires (ARG)
Árbitro: Enrique Osses (CHI)
Público: 57.000
Renda: não divulgada
Gol: Marquinhos 36 do 2º
Cartão amarelo: Ponzio, Kranevitter, Mena e Gabriel Xavier
RIVER PLATE: Barovero (5), Mammana (7), Maidana (4), Funes Mori (4) e Vangioni (6); Kranevitter (6), Ponzio (7) (Mayada, 15 do 2º - 7), Sánchez (6) e Martínez (6) (Pisculichi, 15 do 2º - 4); Mora (6) (Cavenaghi, 22 do 2º - 6) e Gutiérrez (5). Técnico: Marcelo Gallardo
CRUZEIRO: Fábio (6), Mayke (6), Manoel (7), Bruno Rodrigo (8) e Mena (6); Willians (7), Henrique (6) e Arrascaeta (4) (Gabriel Xavier, 12 do 2º - 8); Marquinhos (8), Leandro Damião (7) (Henrique Dourado, 45 do 2º - sem nota) e Willian (7) (Charles, 24 do 2º - 6). Técnico: Marcelo Oliveira

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