Uma noite triste

O que era para ser a noite do reencontro do Grêmio de Felipão com a Copa do Brasil acabou sendo uma jornada duplamente frustrante e triste. Primeiro, claro, pela derrota: o 2 a 0 a favor do Santos em nada reflete o que foi o jogo, de ampla superioridade tricolor em praticamente todo o tempo, e praticamente elimina o time gaúcho. Mas segundo, e principalmente, pelos insultos racistas ao goleiro Aranha. Ele erra ao dizer que isso "sempre acontece" em jogos do Grêmio, mas de fato acontece. É uma meia dúzia de imbecis, alguns já bem identificados. Precisam responder pelo crime que cometeram.

A nota oficial repudiando o ato cometido pelo bando era necessária. O que se espera é que o clube cumpra com o que promete: expulsar os envolvidos do quadro social e impedir que eles compareçam aos jogos do Grêmio, ao menos os disputados em casa, onde o clube realiza o controle de quem entra. Não tem essa de "é difícil identificar". Levei meu sobrinho para realizar o tour da Arena há cerca de um mês e foi dito claramente pelo funcionário do Grêmio que há centenas de câmeras com alta capacidade de identificação facial e leitura labial em TODOS os lugares do estádio. É só ter vontade de realizar o procedimento de expulsão, e divulgá-lo massivamente, para que o mundo inteiro saiba que o clube abomina esse tipo de crime. Ah, e tem que ser expulsão, e não suspensão, como diz o texto oficial. Suspender é pouco, quase nada.

Em relação ao jogo, talvez este mata-mata tenha vindo cedo demais na vida do Grêmio, como aquele na Sul-Americana de 2010, contra o Goiás, quando Renato Portaluppi recém chegava a Porto Alegre. Parece óbvio que o time está realmente perto de encaixar. A derrota precisa considerada levando em conta os erros cometidos: gols perdidos (muitos por culpa de Aranha, outros por displicência na hora de concluir), uma falha claríssima de Werley na marcação a David Braz no primeiro gol e uma defesa desarrumada no contragolpe do segundo, que foi consequência do primeiro e de um erro da arbitragem.

A proposta de jogo, no entanto, funcionou muito bem: o Grêmio encaixotou o Santos na maior parte do jogo, como fizera naquela semifinal da Libertadores de 2007. No primeiro tempo, jogou um futebol de altíssima intensidade: Dudu fez um carnaval pela ponta esquerda a noite inteira, Giuliano foi muito bem ao limpar a marcação na frente da área e dar alguns passes açucarados aos companheiros, Zé Roberto sempre apoiou com alta qualidade. A marcação adiantada forçava o erro do Peixe a todo instante. Mas chances claríssimas eram desperdiçadas. E o Santos, mesmo visivelmente dominado e atordoado com o ritmo gremista, aproveitou com eficiência as chances criadas.

No segundo tempo, Alán Ruiz ainda melhorou a qualidade da atuação ofensiva do Grêmio, substituindo Luan, que cometeu um erro tão ou até mais grave que o de Werley ao perder um gol embaixo da trave - mérito de Mena, mas muito mais uma falha terrível do atacante tricolor. Com Matheus Biteco no meio, Felipão certamente pensou em dar velocidade de recomposição em caso de contragolpes, que o Santos fatalmente exploraria. O Grêmio empilhou chances perdidas. Insistiu demais em Dudu, mas, mesmo que ele estivesse em jornada endiabrada, era necessário pensar em outras alternativas, como Ruiz ou Giuliano. Só após os 35 é que a pressão diminuiu, com o time já cansado de jogar em tamanha intensidade física, e sofrendo com dois contragolpes santistas que quase culminaram numa absurda goleada.

O Grêmio pagou caro por erros individuais. Na mecânica de jogo, não há o que mudar, ao contrário, e os elogios e até otimismo de muitos torcedores entrevistados na saída da Arena são a prova disso. A equipe foi intensa, marcou forte como pede Luiz Felipe, criou muitas chances e dominou o adversário em casa, com pressão da torcida a noite toda. Mas não dá para desperdiçar tantas chances, e não dá para não acompanhar zagueiro adversário em cobrança de escanteio. São erros primários que precisam ser corrigidos. E custaram caro demais: provavelmente a última chance de título no ano.

Em tempo:
- O segundo gol surge de um toque de mão de Lucas Lima, e por isso não computo como falha primordialmente do sistema defensivo gremista, embora ela tenha ocorrido. O erro entra em segundo plano, embora precise ser corrigido. Mas o azar que o Grêmio deu na jogada, com a bola rebatendo em Robinho e entrando, é incorrigível.

- Apesar do erro no segundo gol do Santos, Wilton Pereira Sampaio teve um mérito claro: deixar o jogo correr. Isso, aliás, favoreceu o jogo firme e de alta velocidade imposto pelo Grêmio. O pênalti sobre Zé Roberto é igualmente discutível.

- O Grêmio precisa ir com seus titulares diante do Bahia, um jogo quase tão ou talvez até mais importante que o da Vila Belmiro. O título da Copa do Brasil se tornou tão difícil de ser obtido quanto o do Brasileiro.

Ficha técnica
Copa do Brasil 2014 - Oitavas de final - Jogo de ida
29/agosto/2014
GRÊMIO 0 x SANTOS 2
Local: Arena do Grêmio, Porto Alegre (RS)
Árbitro: Wilton Pereira Sampaio (GO)
Público: 30.294
Renda: R$ 814.899,00
Gols: David Braz 37 e Robinho 44 do 1º
Cartão amarelo: Pará, Ramiro, Edu Dracena, David Braz e Alison
GRÊMIO: Marcelo Grohe (6,5), Pará (5,5), Werley (4), Rhodolfo (5) e Zé Roberto (7) (Matías Rodríguez, 29 do 2º - 5); Walace (6) (Matheus Biteco, intervalo - 6), Ramiro (6) e Giuliano (6,5); Luan (4,5) (Alán Ruiz, intervalo - 6), Barcos (5,5) e Dudu (7,5). Técnico: Luiz Felipe
SANTOS: Aranha (7), Cicinho (5,5), Edu Dracena (6,5), David Braz (7) e Mena (6,5); Alison (5), Arouca (5) e Lucas Lima (7,5); Thiago Ribeiro (5,5) (Alan Santos, 49 do 2º - sem nota), Gabriel (4,5) (Leandro Damião, 36 do 2º - 6) e Robinho (6) (Rildo, 24 do 2º - 4,5). Técnico: Oswaldo de Oliveira

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