Questão de postura



Aos 14 minutos do primeiro tempo, seis jogadores do Grêmio cercaram o árbitro Antonio Arias, indignados pela iminência de um cartão amarelo discutível que o paraguaio estava prestes a aplicar sobre seu conterrâneo Cristian Riveros. Um momento aparentemente pouco relevante, mas que revelou algo fundamental: o Tricolor Gaúcho estava com a faca nos dentes, sangue correndo nas veias. Fato que se comprovou toda a noite no Parque Central.

O Grêmio, fundamentalmente, teve postura em Montevidéu. Mas ela não se resume aos gritos de protesto e à não intimidação diante do cenário adverso no Parque Central. Foi também uma postura de superioridade tática durante quase todo o jogo. O Nacional postou-se em campo com uma humildade surpreendente para um time uruguaio que atua em casa por Libertadores. Em vez de pressionar em busca do gol cedo, ficou atrás esperando o time gaúcho para especular. Talvez Pelusso, que tão bem conhece o Tricolor, saiba que o Nacional é mesmo tecnicamente inferior. Apostou, não sem correção, na velocidade e no bom chute de seus pontas, além da bola aérea e dos pivôs de Alonso.

Assim, o Grêmio teve o campo adversário à disposição, mas só até a intermediária. Porém, em vez de se desestabilizar com o ferrolho charrua, o Tricolor sempre preferiu a troca de passes, com paciência. Eis outro grande mérito: o time gaúcho jamais deu chutão. Foi firme, sem ser grosso - não confundiu nunca uma coisa com outra. Wendell, Luan, Barcos, Ramiro e Riveros buscavam movimentar-se para dar opções a Zé Roberto, centralizador das ações. A marcação uruguaia, porém, se deu melhor nos 45 iniciais. E as melhores chances foram do time da casa - normalmente em arremates longos de De Pena, mas um lance em especial (a ajeitada de Alonso para o chute de Cruzado na área) evidenciou os problemas que o time de Enderson Moreira tinha em enfrentar os adversários no mano a mano. A marcação gremista é que não encaixou no primeiro tempo.

No segundo, porém, a história foi outra. Anulando os lançamentos de Prieto, fonte de todas as jogadas perigosas de ligação direta do Nacional no primeiro tempo, o Grêmio amordaçou os uruguaios. Faltava, porém, ser mais incisivo. A partir dos 20 minutos, a equipe foi trocando passes cada vez mais próximos à área. A torcida uruguaia, sentindo o mau momento do time, passou a gritar cada vez mais alto, mas de nada adiantou. Numa jogada coletiva longa, de deslocamentos coordenados típicos de times entrosados, Barcos saiu da área para o surpreendente ingresso de Ramiro, que cruzou para o cabeceio de Riveros. Era o Grêmio dos três volantes provando de novo, como em boa parte de 2013, que um time com três centromédios não necessariamente é desprovido de força ofensiva.

Fora o abafa final do Nacional, já com Recoba em campo, o Grêmio seguiu melhor, tendo mais chances de ampliar que de sofrer o empate. Alguns jogadores merecem menção, fora os já citados pelo lance do gol. Em especial, Rhodolfo e Edinho, os dois melhores em campo. O zagueirão foi sempre firme no combate ao perigoso Iván Alonso, ganhando quase todas por cima e saindo para o jogo com qualidade (o Grêmio se recusou a sair no chutão durante os 90 minutos, algo até perigoso em determinados momentos, mas que precisa ser saudado). Já Edinho, desarmando e tocando para o lado, simplificou e foi o leão de seus melhores tempos. Marcador implacável.

O resultado é espetacular. Num grupo equilibrado como este, qualquer ponto fora de casa é valioso. Sair com três, então, pode ser um diferencial a favor do Grêmio que Newell's e Atlético Nacional talvez nem consigam no Parque Central - ou o próprio Nacional, em seus jogos fora. Agora, há dois jogos seguidos na Arena. Obter seis pontos seria ótimo, quatro seriam aceitáveis. O certo é que será preciso confirmar o bom começo jogando em casa, ou o resultado de ontem pouco adiantará. Não há refresco quando a chave é complicada, e esta é a mais complicada de todas, talvez de todas as 15 Libertadores gremistas nestes 32 anos.

Tabus
O Grêmio quebrou um tabu histórico ontem à noite: o de nunca ter vencido uruguaios fora de casa em jogos oficiais. A equipe já havia enfrentado Peñarol, Defensor, Nacional e Liverpool-URU em nove oportunidades no país vizinho. Outro tabu, porém, foi mantido: há 61 anos, o Tricolor não perde para o Bolso. Foram 20 jogos com o de ontem, com 12 vitórias do Grêmio, 7 empates e só 1 derrota. Supremacia total.

Jogo de líderes
A vitória do Atlético Nacional sobre o Newell's Old Boys foi apertada, mas merecida. O time colombiano dominou o jogo todo, enquanto os argentinos foram inexplicavelmente covardes fora de casa. Com isso, o jogo do dia 25, na Arena, será o de líderes. A curiosidade é que a 2ª rodada terá duas ex-finais de Libertadores: Grêmio x Atlético Nacional decidiu o torneio em 1995, enquanto Newell's x Nacional foi a final de 1988. Grupaço.

Em tempo:
- Adriano ainda está um tanto travado, algo absolutamente normal para quem não joga há tanto tempo. Mas vê-lo recuperado, de volta ao esporte profissional, é emocionante. Nem tanto pelo jogador, mas pela pessoa. Histórias de reabilitação emocionam sempre.

- Neste sábado, análise completa de Atlético Nacional x Newell's, desvendando os mistérios dos próximos adversários gremistas aqui no Carta na Manga.

Comentários

Edinho foi um monstro ontem no desarme. Boa antecipação e muito bom combate, sem cometer falta no adversário.
Time todo está de parabéns pelo jogo de ontem. Há necessidade de aprimoramento? Há, mas isso virá ao natural. O que interessa é que o demonstrado, até agora, está acima das expectativas de muitos (incluindo a mim). Agora é evoluir aos poucos.

No mais, vi os quinze primeiros minutos de Nacional Medellín x Newell´s. Vamos suar contra ambos. Os dois próximos jogos são determinantes.
Vicente Fonseca disse…
Edinho foi MUITO bem. O melhor junto com o Rhodolfo.

Quando a Atl. Nacional x Newell's, achei o time argentino extremamente covarde. Postura totalmente oposta à do Grêmio no Parque Central. Derrota merecida - e barata, poderia ter sido 2 ou 3 a 0.
Chico disse…
Uma vitória maiúscula. Time experiente e copero.

Rhodolfo anulou Alonso. Riveiros foi um monstro além de usar a 16 e fazer um golo de cabeça.

A esperança está de volta.
Sancho disse…
Não achei, Vicente. Principalmente no segundo tempo, o Ñuls buscou o jogo e teve, no mínimo duas ou três chances (e um gol mal anulado).

P.S.: Minha palavra-chave "true love". Que fofonho!
Vicente Fonseca disse…
Já li outras pessoas que concordam contigo, Sancho. Eu acho que faltou ambição pro NOB. Foram 21 chutes contra 3. Pediram tanto pra tomar que tomaram o gol. Mas não me engano, é um time forte e promete dois jogos difíceis contra o Grêmio.