Não foi só a areia

Faltou competência. O Brasil caiu precocemente na Copa América não por azar, porque o gramado do Ciudad de La Plata é ruim, porque Neymar foi caçado, nada disso. Foi eliminado por incompetência, escancarada nas quatro patéticas cobranças de pênalti desperdiçadas por Elano, Thiago Silva, André Santos e Fred.

O Brasil não jogou um mau futebol hoje, façamos justiça. Mesmo assim, pressionar o Paraguai não chegou a ser um grande mérito. Na verdade, as inúmeras chances perdidas explicam-se muito mais pela estratégia paraguaia: a retranca, contra um adversário bagunçado, muitas vezes funciona. No entanto, mesmo depois de classificado, não hesito em criticar o time de Gerardo Martino. Afinal, a albirroja não é tão inferior ao Brasil a ponto de precisar deste expediente. Se tivesse encarado, como na primeira fase, poderia ter saído com a vitória. Não perdeu exclusivamente pela incompetência alheia - e aí voltamos ao começo do texto.

Desta vez, houve boa mecânica de jogo. O 4-3-3 que beira o 4-2-4 aplicado por Mano Menezes não chegou a ser inconsistente ou arriscado. Diante da postura guarani, era um esquema até bastante adequado. Lucas deu conta tranquilo da marcação na meia-cancha, e Ramires até mesmo pode se soltar em suas habituais arrancadas dos tempos de Cruzeiro. Robinho foi outro que participou bem do jogo, como não havia feito ainda nesta Copa América.

Mas houve muitos problemas técnicos em termos de atuações individuais, o que explicita que a atuação da seleção não chegou a ser boa ou mesmo convencer. Neymar, por exemplo, nem de longe foi o fator de desequilíbrio que deveria. Não se escondeu do jogo, mas esteve bem marcado e perdeu chances que não poderia. Ganso, à exceção de um ou dois passes, foi nulo. Nunca assumiu a criação, nunca fez o time jogar, tampouco jogou. Pato até teve algum poder de conclusão, mas também apareceu pouquíssimo. Maicon, melhor em campo contra o Equador, fez uma de suas piores exibições com a camisa amarela.

O segundo tempo, ao contrário do primeiro, foi quente. Tudo porque o Brasil voltou disposto a encurralar o Paraguai e fazer o gol de qualquer jeito, mas a dificuldade em superar o bloqueio defensivo e a má pontaria prejudicaram os planos. O Paraguai chegou a gostar do jogo por cerca de 5 minutos, mas em nenhum nomento ameaçou o Brasil, panorama bem diferente do duelo entre os dois na primeira fase. Na prorrogação, por outro lado, não houve jogo. Nem os brasileiros continuaram no ritmo alucinante, nem os paraguaios fizeram por merecer qualquer chance de gol. A pancadaria que ocasionou a expulsão de Lucas Leiva e Alcaraz matou o ritmo da partida.

Os pênaltis foram um capítulo à parte. A displicência absurda na corrida para a bola já anunciava que Elano erraria. Certamente, pesou muito mais que a areia que fazia parte do assoalho do péssimo gramado de La Plata. O mesmo ocorreu com André Santos, que tem uma máscara maior que a de Roberto Carlos, sem jogar 1/10 do que o antigo camisa 6 jogava. Já a Thiago Silva faltou firmeza. A Fred, concentração: já estava praticamente perdido mesmo, parecia já nem acreditar, bateu sem qualquer cuidado. A Júlio César, faltou calma. Não fosse tão precipitado, não se atiraria em duas cobranças que foram no meio do gol.

O Brasil dá vexame. Cai numa Copa América onde só venceu uma vez em quatro jogos, jogando muito mal em duas e razoável nas outras. Mano Menezes talvez tenha vida curta no comando técnico, e será merecido. Vem fazendo um mau trabalho. Mas a culpa não é só dele. É de toda uma ideia mirabolante, comprada por ele e enfiada goela abaixo do país inteiro, que surgiu naquela derrota para a Holanda, ano passado: era preciso estirpar o "mau-humor", os Felipes Melos, em troca de um futebol maroto, com moleques atrevidos, jogando para a frente, um futebol "brasileiro". Equilíbrio, palavra tão importante no futebol e em tudo na vida, nunca foi cogitado. Desculpem a auto-referência, mas a última frase do meu texto analisando aquela derrota na África do Sul está se confirmando plenamente. Não era tão difícil de acertar, convenhamos.

Em tempo:
- O aniversário de 17 anos do tetracampeonato, conquistado nos pênaltis, não merecia uma ironia do destino tão lamentável e cruel.

Copa América 2011 - Quartas de Final
17/julho/2011
BRASIL 0 x PARAGUAI 0
Decisão por pênaltis: Brasil 0 x Paraguai 2
Local: Ciudad de La Plata, La Plata (ARG)
Árbitro: Sérgio Pezzotta (ARG)
Público: não divulgado
Cartão amarelo: André Santos, Maicon, Vera, Barreto, Marecos e Estigarribia
Expulsão: Lucas Leiva e Alcaraz 12 do 1º da prorrogação
BRASIL: Júlio César (5,5), Maicon (4), Lúcio (5,5), Thiago Silva (5) e André Santos (4,5); Lucas Leiva (5), Ramires (6) e Ganso (4,5) (Lucas Silva, 9 do 1º da prorrogação - 5); Robinho (6), Pato (5) (Elano, 5 do 2º da prorrogação - 3) e Neymar (5,5) (Fred, 34 do 2º - 4,5). Técnico: Mano Menezes (5)
Pênaltis: Elano (fora), Thiago Silva (defendido), André Santos (fora) e Fred (fora)
PARAGUAI: Villar (9), Verón (5,5), Da Silva (7), Alcaraz (6) e Torres (5,5) (Marecos, 25 do 2º - 6); Vera (5,5) (Barreto, 18 do 2º - 5,5), Riveros (5,5), Cáceres (5) e Estigarribia (5,5); Haedo Valdez (5,5) e Barrios (4,5) (Pérez, 38 do 2º - 5). Técnico: Gerardo Martino (5,5)
Pênaltis: Barreto (fora), Estigarribia (gol) e Riveros (gol)


Comentários

Igor Natusch disse…
Assino embaixo.

Poucas vezes uma derrota nos pênaltis refletiu de forma tão clara o fracasso de um modo de trabalho e de uma linha de pensamento. Todos erraram, pelo simples motivo que tudo, ou quase tudo, está errado. Na sanha maluca de montar um time alegre, faceiro, que joga para a frente e honra o tal "futebol brasileiro", pariu-se esse time sem personalidade, que só sabe jogar na boa, que não encara de frente as dificuldades do jogo e que, basicamente, treme nas bases diante de qualquer equipe minimamente competitiva. Tem sido assim desde o começo; não era agora, na Copa América, que ia mudar.

Mano Menezes rendeu-se ao delírio pátrio e afunda na areia movediça da pior forma possível: submisso, sem espernear, sem demonstrar indignação diante da morte. Faz péssimo trabalho. Faz por merecer a mudança de comando técnico. Que não virá: Ricardo Teixeira, justo timoneiro de uma nau superfaturada, garante que ele ficará. Como se vê, a festa de 2014 está muito bem encaminhada.
Tu tá sendo modesto, meu amigo. Todo o último parágrafo daquele texto serve pra hoje. É justo o que está acontecendo. E como tu disse, não era difícil prever.

Aliás, é impressionante como toda a ideia de trabalho do Dunga foi jogada no lixo e causa aversão nos dias de hoje. Nem o sistema defensivo e o rápido contra ataque, os dois maiores trunfos da era dele, ficaram de herança.

Foram apostar nesse novo quadrado mágico, de jovens promessas, e está aí nosso primeiro resultado: eliminado por uma equipe que ainda não venceu na competição. Mano Menezes deve estar engolindo um sapo boi: esse 4-2-4 ele sabia desmontar fácil. 2006 que o diga. Agora se submete a ele. Tristes tempos...
Lique disse…
a única falha do dunga, de fato, em todo seu MANDATO, foi perder pra holanda num momento de apagao e nao saber reagir. nao era qualquer equipe, terminou vice campea. de resto, mesmo com vagner love, foi uma bela copa américa e uma copa das confederaçoes na superaçao.

mano até agora, decepciona demais, totalmente rendido pela política da mídia e da cbf. me dói dizer isso, por que sou grande fa e nao esperava isso do mano.
franke disse…
que duro golpe de luva nos entusiastas da dupla neymar/ganso.

mano fica até a copa?
Chico disse…
O mais engraçado é a choradeira do Galvão Bueno ao final do jogo.

Galvão + Casagrande = Mr Hyde e Frankstein
juca disse…
Anotem: este foi o último jogo do Lúcio pela seleção.