Uma Rússia como nos velhos tempos

A prorrogação foi uma circunstância do jogo, de uma desatenção momentânea que resultou no empate. Nela, restabeceleu-se a verdade dos fatos. E esta verdade indica uma Rússia superior na maior parte da partida, que controlou a força holandesa, saiu com velocidade e qualidade e sobrou na parte física.

Talvez a trágica morte da filhinha do zagueiro Boulahrouz tenha afetado os ânimos dos batavos. De qualquer forma, o primeiro mérito russo foi ter impedido a Holanda de jogar. Não foi com uma marcação ofensiva, nos zagueiros adversários, que isso aconteceu. Foi dando campo aos defensores holandeses e postando seu time atrás da linha da bola, não deixando a bola chegar em Sneijder, Kuyt e Van der Vaart. A Holanda teve sempre seu maior mérito em jogar no contra-ataque após abrir vantagem contra adversários que jogavam com ela de igual para igual. Não foi o caso de hoje.

Porque a Rússia esperou a Holanda, impediu-a primeiro de jogar, para sair contra-golpeando. E isso os russos fizeram com maestria. O toque de bola deste time de Guus Hiddink é tão afinado que mesmo quando o time sai jogando de sua defesa parece que contra-ataca, tal a velocidade e qualidade das triangulações. Bem assessorado por três meias que também combatem, Arshavin deu show. Pavlyuchenko, centroavante tosco, porém impiedoso, viveu momentos de fartura.

O primeiro golo saiu aos 11 do segundo tempo, com Pavlyuchenko completando com grande oportunismo um cruzamento de Semak. A saída pelo lado esquerdo de ataque e a conclusão foram tão rápidos que os holandeses simplesmente não tiveram como marcar a jogada. O jogo ficava ainda mais à feição para os russos. A Holanda se viu obrigada a abandonar seu estilo calmo de troca de passes e passou a chutar de longe. Sneijder conseguiu alguns bons arremates. Os russos continuavam jogando no erro batavo, e chutes de média distância igualmente eram uma constante. Time que não tem medo de chutar.

Quando o time de Marco van Basten já não tinha nem perna mais, veio o golo de cabeça de Nistelrooy, aos 41. A Holanda martelou e achou o empate, mas sabia que a vida na prorrogação não seria nada fácil. Somente o lado psicológico favorável passava a ser um ponto favorável. Nem a entrada do descansado Van Persie dava resultados.

Nos 30 minutos de tempo extra, um massacre da Rússia. Com iniciativa absoluta das ações, o time de Guus Hiddink, mais jovem, sobrava no aspecto físico. A Holanda tentava diminuir o ritmo com trocas de passe lentas, mas a cada retomada os russos encaixavam um ataque rápido. Os holandeses se arrastavam em campo. Com cada vez mais espaço, veio a vitória russa. Primeiro com Torbinski, que aproveitou cruzamento após grande jogada de Arshavin e fez o segundo, aos 7 do segundo tempo. Quatro minutos, após batida de lateral, o próprio camisa 10 fez a pá-de-cal.

Neste texto, sobre o jogo de estréia da Rússia, eu já havia atentado para qualidades que apareceram na equipe de Hiddink, mesmo com a goleada sofrida para a Espanha. Qualidades estas que vieram a se confirmar ao longo desta Euro, e que podem levar os russos mais adiante. Quem viu a Copa da UEFA, garante que o Zenit joga de forma parecida. Mais uma favorita que cai: a Holanda jogou como nunca, e perdeu como sempre. Itália e Espanha que se cuidem. Não confio em título para a Rússia, mas é um time jovem, uma geração talentosa que surge, e que merece muito respeito.

Em tempo:
- Quem prestou atenção em Zhirkov certamente lembrou-se de Luciano "Marreta" Fonseca.

Eurocopa 2008 - Quartas-de-final
21/junho/2008
HOLANDA 1 x RÚSSIA 3
Local: Saint-Jakob Park, Basiléia (SUI)
Árbitro: Lubos Michel (EVQ)
Público: não divulgado
Golos: Pavlyuchenko 10 e Nistelrooy 40 do 2º; Torbinski 6 e Arshavin 10 do 2º da prorrogação
Cartão amarelo: Boulahrouz, Van der Vaart, Van Persie, Kolodin, Zhirkov e Torbisnki
HOLANDA: Van der Sar (6,5), Boulahrouz (5) (Heitinga, 8 do 2º - 4,5), Ooijer (5), Mathijsen (5,5) e Bronckhorst (5); De Jong (5,5), Engelaar (5) (Afellay, 16 do 2º - 4,5), Van der Vaart (5,5), Kuyt (4,5) (Van Persie, intervalo - 5) e Sneijder (6); Nistelrooy (5,5). Treinador: Marco van Basten (4,5)
RÚSSIA: Akinfeev (7), Anyukov (5,5), Ignashevich (6), Kolodin (7) e Zhirkov (5,5); Semak (7), Zyryanov (5,5), Semshov (6) (Bilyaletdinov, 24 do 2º - 5,5) e Saenko (6,5) (Torbinski, 36 do 2º - 6,5); Arshavin (8,5) e Pavlyuchenko (7,5) (Sychev, 10 do 2º da prorrogação - sem nota). Treinador: Guus Hiddink (9)

Foto: Reuters

Comentários

Lique disse…
se a lógica continuar, itália mata a espanha hoje. mas nunca se sabe quando vai ser o grande dia que a espanha vai surpreender. tá pra acontecer.
Anônimo disse…
essa euro esta para o apelido "o crepusculo dos idolos".

que baita jogo da russia. das apresentacoes na euro que vi ate agora, a melhor. primeiro pela qualidade do adversario, e segundo pela constancia. eles dominaram todo o jogo e nunca se cansaram de tentar o gol, mesmo perdendo varios na segunda metade do segundo tempo. e grande atuacao do lateral esquerdo.

eu torcia pelos representantes das terras baixas, mas depois desse jogo virei czarista.
Vicente Fonseca disse…
Todos os campeões de grupo perderam até agora. Vitória da Espanha contraria esta lógica e a lógica histórica de "Espanha medrosa e Itália copeira".

Achei que o lateral-esquerdo, Zhirkov, fez boa partida, mas meio descontrolado. Mas foi bem na marcação ao Kuyt mesmo.